RECURSO – Documento:6985920 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5000245-06.2025.8.24.0001/SC RELATOR: Desembargador MONTEIRO ROCHA RELATÓRIO Na comarca de Abelardo Luz, F. Z. S. ajuizou esta ação declaratória e indenizatória em face de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. Arguiu que a instituição financeira ré tem realizado descontos mensais em seu benefício previdenciário a título de empréstimo consignado, referente ao contrato nº 816060947, o qual afirma desconhecer. Diante disso, requereu o deferimento de tutela de urgência, bem como ao final a procedência da ação para que seja declarada a inexistência de relação jurídica entre as partes quanto ao mencionado contrato, bem como a restituição dos valores indevidamente descontados e a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais, estimada em R$ 20.000,00.
(TJSC; Processo nº 5000245-06.2025.8.24.0001; Recurso: recurso; Relator: Desembargador MONTEIRO ROCHA; Órgão julgador: Turma, julgado em 25-6-2019).; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:6985920 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5000245-06.2025.8.24.0001/SC
RELATOR: Desembargador MONTEIRO ROCHA
RELATÓRIO
Na comarca de Abelardo Luz, F. Z. S. ajuizou esta ação declaratória e indenizatória em face de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. Arguiu que a instituição financeira ré tem realizado descontos mensais em seu benefício previdenciário a título de empréstimo consignado, referente ao contrato nº 816060947, o qual afirma desconhecer. Diante disso, requereu o deferimento de tutela de urgência, bem como ao final a procedência da ação para que seja declarada a inexistência de relação jurídica entre as partes quanto ao mencionado contrato, bem como a restituição dos valores indevidamente descontados e a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais, estimada em R$ 20.000,00.
Processo redistribuído para a comarca de Rio do Oeste em razão do Projeto de Jurisdição Ampliada na forma da Res. TJ n. 15/2021 (evento 4).
O pedido de tutela foi indeferido (6).
Regularmente citado, o réu apresentou contestação (Ev. 16), na qual impugnou o valor da causa e a concessão dos benefícios da gratuidade da justiça. Preliminarmente, arguiu ausência de interesse de agir, inépcia da petição inicial e prescrição. No mérito, sustentou a regularidade da contratação.
A autora apresentou réplica (Ev. 27).
A parte ré requereu a ouvida do depoimento pessoal da autora (27).
Conclusos os autos, sobreveio sentença que acolheu em parte os pedidos da autora, nos seguintes termos (34):
Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão formulada, extinguindo-se o feito com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC), a fim de:
a) DECLARAR a inexistência de relação jurídica entre as partes com relação ao contrato de nº 816060947 (Ev. 01, 09), cabendo à parte ré a exclusão da dívida e a inibição de todos os atos de cobrança remanescentes;
b) CONDENAR a parte ré a restituir em favor da parte autora, em dobro, os valores descontados ilegalmente, que deverão ser corrigidos monetariamente (IPCA) a partir de cada parcela (art. 389, parágrafo único, do CC), e acrescidos de juros de mora pela taxa Selic (art. 406, § 1º, do CC) a contar da citação, deduzido o índice de atualização monetária.
c) CONDENAR a parte ré pagamento de compensação por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), que deverá ser corrigido monetariamente (IPCA) a partir desta data (art. 389, parágrafo único, do CC), e acrescido de juros de mora pela taxa Selic (art. 406, § 1º, do CC) a contar da citação, deduzido o índice de atualização monetária.
Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários sucumbenciais, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, na forma do artigo 85, §2º, do CPC.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. INTIMEM-SE.
Irresignado, o Banco Bradesco Financiamentos S/A interpôs o presente recurso de apelação, alegando, preliminarmente, a falta de interesse de agir da autora, por ausência de prévio requerimento administrativo, e a prescrição trienal prevista no art. 206, §3º, V, do Código Civil. Sustentou, ainda, a decadência quadrienal da pretensão de anulação do contrato, nos termos do art. 178, II, do mesmo diploma legal. No mérito, defendeu a validade da contratação impugnada, afirmando que o contrato foi regularmente firmado, com assinatura da autora e liberação dos valores em sua conta bancária, o que afasta a alegação de fraude. Argumentou que houve consentimento válido, presentes os requisitos do art. 104 do Código Civil, e que a instituição financeira agiu de boa-fé e dentro da legalidade, inexistindo qualquer ilícito. Sustentou, ainda, cerceamento de defesa, sob o argumento de que requereu em contestação a expedição de ofício ao Banco do Brasil para comprovar o recebimento dos valores, mas o pedido não foi apreciado pelo juízo de origem. Afirmou que a autora demonstrou comportamento contraditório, permanecendo inerte por mais de quatro anos antes de ajuizar a demanda, o que configuraria anuência tácita, violação à boa-fé objetiva e aplicação dos princípios da supressio e do venire contra factum proprium. Aduziu que o dano moral não restou comprovado, tratando-se de mero dissabor, e que o valor fixado em R$ 5.000,00 é exorbitante, devendo ser reduzido em atenção aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Defendeu, ainda, que a restituição em dobro foi indevidamente imposta, pois o engano foi justificável e não houve má-fé por parte da instituição financeira. Pugnou pelo conhecimento e provimento do recurso (44).
Contrarrazões juntadas no evento 52.
É o relatório.
VOTO
Conheço do recurso, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.
Versam os autos sobre recurso de apelação interposto pelo banco réu em face da sentença que, proferida nesta ação declaratória e indenizatória movida por F. Z. S., conferiu parcial procedência aos pedidos por si formulados.
Na origem, a autora alegou ser beneficiária de aposentadoria e ter constatado descontos indevidos em seu benefício previdenciário, decorrentes de empréstimo consignado que jamais contratou junto à instituição financeira ré. Sustentou ter sido vítima de fraude e requereu a declaração de nulidade do contrato, a suspensão imediata dos descontos, a devolução em dobro dos valores indevidamente debitados e a indenização por danos morais, em razão dos transtornos experimentados.
O juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para: a) declarar inexistente a relação jurídica referente ao contrato nº 816060947; b) determinar a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente, acrescida de correção monetária pelo IPCA desde cada parcela e juros pela taxa SELIC a partir da citação; c) condenar o banco ao pagamento de R$ 5.000,00 a título de danos morais, com correção e juros legais; d) atribuir ao réu a integralidade dos ônus sucumbenciais.
A súplica recursal é dirigida contra sentença que julgou procedentes em parte os pedidos.
1. Prefacial de cerceamento de defesa
Sustenta o réu, em prefacial, o cerceamento de seu direito de defesa em razão do julgamento antecipado da lide, arguindo ser necessária a produção de prova documental postulada (expedição de ofício ao Banco Central do Brasil), razão por que requer nulidade da decisão, com retorno dos autos para produção da prova.
Sem razão, contudo.
Isso porque, não configura cerceamento de defesa o julgamento antecipado da demanda quando a instrução probatória se mostra despicienda à formação do convencimento do Magistrado.
Embora se reconheça a produção da prova como direito inerente ao amplo acesso à jurisdição (art. 5º, CF), essa prerrogativa sofre temperamentos, ao prudente arbítrio do Magistrado, a quem incumbe a verificação da sua utilidade, por também lhe ser imposto o dever de fiscalizar e disciplinar a marcha processual de acordo com os princípios da economia processual e da celeridade (art. 5º, LXXVIII, da CF).
Ao Magistrado assiste o poder discricionário de valorar a prova ou determinar a sua produção de modo a formar seu livre convencimento de forma motivada, consoante dispõe os artigos 370, parágrafo único e 371 do Código de Processo Civil:
"Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.
Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias.
Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento."
Na hipótese, a Magistrada a quo entendeu prescindível a dilação probatória pretendida pela autora, considerando ser suficiente ao deslinde do feito a documentação que repousa nos autos.
De mais a mais, embora não seja conferida ao Magistrado a liberdade absoluta na apreciação e valoração da prova, por ser norteado pelo princípio do livre convencimento motivado (art. 371, CPC), cabe a ele o indeferimento das consideradas dispensáveis.
Outrossim, in casu, foram cumpridos os requisitos autorizadores do julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, I, do Código de Processo Civil, que assim prescreve: "Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando: I - não houver necessidade de produção de outras provas;"
Sobre o tema, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, lecionam:
"O dispositivo sob análise autoriza o juiz a julgar o mérito de forma antecipada, quando a matéria for unicamente de direito, ou seja, quando não houver necessidade de fazer-se prova em audiência." (Código de Processo Civil comentado, 9ª ed., RT, 2006, p. 523).
Inclusive, nesse sentido, já decidiu este Órgão Fracionário, em Acórdão de minha relatoria:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E NULIDADE CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.RECURSO DA REQUERENTE. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA ANTE O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INACOLHIMENTO. DILAÇÃO PROBATÓRIA DESNECESSÁRIA AO DESLINDE DO FEITO. ACERVO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA A FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 371, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.MÉRITO. PLEITO OBJETIVANDO A REFORMA DA SENTENÇA, COM O CONSEQUENTE RECONHECIMENTO DA IRREGULARIDADE DOS DESCONTOS MENSAIS OPERADOS EM SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INSUBSISTÊNCIA. BANCO DEMANDADO QUE ACOSTOU AOS AUTOS CÓPIA DO CONTRATO DEVIDAMENTE ASSINADO PELA AUTORA, E DOS DEMAIS DOCUMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO DA TOMADORA DO CRÉDITO (RG E COMPROVANTE DE RENDA). DISPONIBILIZAÇÃO, ADEMAIS, DO NUMERÁRIO NA CONTA BANCÁRIA DA REQUERENTE DEVIDAMENTE DEMONSTRADA. VALIDADE DO CONTRATO RECONHECIDA. REGULARIDADE DOS DESCONTOS EFETUADOS VERIFICADA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO INEXISTENTE. EXEGESE DO ARTIGO 14, §3º, INCISO I, DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL NÃO CONFIGURADOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000847-89.2020.8.24.0027, do , rel. Denise Volpato, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 16-03-2021).
Dito isso, no caso, denota-se que as provas carreadas aos autos mostram-se suficientes para o deslinde do feito, afigurando-se perfeitamente cabível o julgamento da lide no estado em que se encontra.
Desse modo, inocorrente o alegado cerceamento do direito de defesa, afasta-se a prefacial aventada.
2. Preliminar de falta de interesse de agir
O banco alega que a autora não buscou a via administrativa nem demonstrou qualquer resistência do banco antes de acionar o Judiciário, o que afastaria o conflito de interesses necessário à formação da lide (art. 17 e 485, VI, do CPC). Argumenta que não basta a simples alegação de fraude sem tentativa de solução prévia, sob pena de violação ao art. 5º, XXXV, da CF, que exige lesão ou ameaça de direito.
Razão lhe assiste.
Dispõe o art 5º, XXXV, da Constituição Federal que "a lei não excluirá de apreciação do Sabe-se que o acesso ao Ainda que a autora não tenha requerido administrativamente a composição do feito, bem com não tenha apresentado cópia dos contratos, irrelevante são estes fato para o manejo da demanda judicial, pois a via administrativa não é pressuposto legal ao ingresso da demanda judicial.
Assim, é prematuro afastar o jurisdicionado de seu direito constitucional de acesso à justiça para eleger via ainda incipiente de solução de conflitos, especialmente quando a demanda já fora proposta e provocada a prestação jurisdicional.
Nesse contexto, "não pode a lei infraconstitucional condicionar o acesso ao Traz-se aos autos entendimento jurisprudencial aplicados em demandas análogas ao caso vertente:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REGRESSIVA. SEGURADORA CONTRA CELESC. DANOS EM EQUIPAMENTOS POR OSCILAÇÕES NA REDE ELÉTRICA. DIREITO DE SUB-ROGAÇÃO. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL. RECURSO DA AUTORA. INTERESSE PROCESSUAL. DISPENSABILIDADE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL EM TAL SENTIDO" (TJSC, Apelação n. 0320596-42.2018.8.24.0038, do , rel. Luiz Felipe Schuch, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 17-6-2021).
"AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO COMBINADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. DESNECESSIDADE DE PRÉVIO ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA NOS TERMOS DA RESOLUÇÃO INSS N. 321/2013, SOB PENA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO (ART. 5º, XXXV, CF/1988 E ART. 3º, CAPUT, CPC/2015). PRECEDENTES DESTA CORTE. RECURSO PROVIDO PARA CASSAR A SENTENÇA" (TJSC, Apelação n. 5001778-83.2021.8.24.0051, do , rel. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 25-10-2022).
Com estas premissas, rejeita-se o apelo neste tópico.
3. Prescrição e decadência
Alega a instituição financeira ré que, versando a demanda sobre vício do serviço, e não fato do serviço, aplica-se o prazo prescricional de 3 anos (art. 206, §3º, V, do CC), e não o quinquenal do art. 27 do CDC. Alega que o primeiro desconto ocorreu em maio de 2021, e a ação foi ajuizada em janeiro de 2025, após o triênio legal, razão pela qual o feito deveria ser extinto com resolução de mérito (art. 487, II, CPC).
Alternativamente, argumenta que a pretensão de anulação do contrato está fulminada pela decadência quadrienal prevista no art. 178, II, do CC, uma vez que o negócio foi firmado em 2021 e a ação só foi proposta em 2025.
A tese deve ser igualmente rejeitada.
Isto porque, dada a natureza declaratória e indenizatória dos pedidos formulados na peça inicial, tem entendido esta Corte de Justiça, pautada na jurisprudência do Colendo STJ, que o direito perquirido submete-se ao prazo de prescrição decenal, nos termos do art. 205 do Código Civil.
Sobre o tema:
AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. NULIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO DECENAL. 1. Em se tratando de responsabilidade contratual, como sucede com os contratos bancários, salvo o caso de algum contrato específico em que haja previsão legal própria, especial, o prazo de prescrição aplicável à pretensão de revisão e de repetição de indébito será de dez anos, previsto no artigo 205 do Código Civil. Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no REsp n. 1.769.662/PR, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 25-6-2019).
No mesmo sentido, colhe-se julgado desta Corte:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO, DEVOLUÇÃO DE VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE EM DOBRO E DANOS MORAIS. CRÉDITO OBTIDO POR MEIO DE SAQUE EM CARTÃO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNADA. AUTORA QUE PRETENDE A DECLARAÇÃO DE INVALIDADE DA OPERAÇÃO COM BASE EM VÍCIO NA AUTONOMIA DA VONTADE, SUSTENTANDO, PARA TANTO, TER SIDO LUDIBRIADA COM A PACTUAÇÃO DE CARTÃO, QUANDO, NA VERDADE, PRETENDIA APENAS A CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSOS INTERPOSTOS POR AMBOS OS LITIGANTES. 1. RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. 1.1 QUESTÕES PRÉVIAS. PRESCRIÇÃO. INVOCADA A REGRA DO ARTIGO 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. PRAZO TRIENAL. REPARAÇÃO CIVIL. NORMA INAPLICÁVEL AO CASO. INCIDÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL PREVISTO NO ARTIGO 205 DO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. LAPSO TEMPORAL, CONTADO DA DATA DO CONTRATO, NÃO ESCOADO NO MOMENTO DO AJUIZAMENTO DA CAUSA. PREFACIAL AFASTADA.
No caso em tela, a tratar de ação com pedido de reparação de danos fundada em responsabilidade contratual, o exercício da pretensão de direito material submete-se ao prazo ordinário, de dez anos previsto no art. 205 do Código Civil.
PLEITO PARA RECONHECIMENTO DA DECADÊNCIA DO DIREITO DA AUTORA COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 178 DO CÓDIGO CIVIL. INAPLICABILIDADE DO PRAZO DE ANULAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO PREVISTO NESSA NORMA. AÇÃO SUBJACENTE EM QUE SE PLEITEIA O RECONHECIMENTO DA NULIDADE DE CONTRATAÇÃO QUE SE SUBMETE APENAS A PRAZO PRESCRICIONAL. TESE NÃO ACOLHIDA. [...] (TJSC, Apelação n. 5004567-37.2021.8.24.0930, do , rel. Luiz Zanelato, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 22-06-2023, sem grifos no original).
Outrossim, a pretensão indenizatória surge a partir da assinatura do pacto supostamente viciado, sendo esta a data do termo inicial da contagem do prazo de prescrição decenal.
Então, dada a circunstância de ser o contrato datado do ano de 2021 e tendo a lide seu ajuizamento em 2025, descabe falar em extinção da pretensão da parte.
4. Exigibilidade dos descontos - pleito de afastamento da declaração de inexistência de débito e da consequente repetição em dobro do indébito
Alega a instituição financeira ré, em síntese, que os descontos realizados no benefício da autora são legítimos, posto que expressamente contratou o empréstimo e beneficiou-se com o recebimento dos valores.
Sem razão a recorrente.
Em se tratando de declaratória de inexistência de débito ou relação jurídica onde o autor argumenta que não contratou os serviços prestados, cabe à ré a prova de fato impeditivo e modificativo do direito do autor (art. 373, II, do CPC), demonstrando a pactuação mediante juntada de documento idôneo.
Por outro lado, caso o autor não reconheça ser o executor da assinatura e impugne a firma lançada no instrumento juntado, é ônus da ré - que apresenta o documento - comprovar que tal assinatura é autêntica e pertence ao autor, conforme o art. 429, II, do CPC, verbis:
Art. 429. Incumbe o ônus da prova quando:
[...]
II - se tratar de impugnação da autenticidade, à parte que produziu o documento.
É entendimento assente do STJ que "Tratando-se de contestação de assinatura, o ônus da prova da sua veracidade cabe à parte que produziu o documento. A fé do documento particular cessa com a impugnação do pretenso assinante, e a eficácia probatória do documento não se manifestará enquanto não comprovada a sua veracidade" (EDcl no AgRg no AREsp 151.216/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, julgado em 17/09/2013, DJe 20/09/2013).
Nesse sentido, é o entendimento desta Segunda Câmara de Direito Civil:
- "APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. APELO DA RÉ E RECURSO ADESIVO DO AUTOR. TESE DE AUSÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. INSUBSISTÊNCIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO DESCONTADO INDEVIDAMENTE NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO REQUERENTE. PERÍCIA JUDICIAL QUE INDICOU NÃO TER O AUTOR ASSINADO O CONTRATO. INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO. ATO ILÍCITO EVIDENCIADO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. [...] APELO DO RÉU CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO ADESIVO DO AUTOR PREJUDICADO" (TJSC, Apelação n. 5006627-34.2020.8.24.0019, do , rel. Rosane Portella Wolff, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 17-02-2022).
"APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. RECURSO DO RÉU. PRETENSA REFORMA DA SENTENÇA. ALEGADA CONTRATAÇÃO VÁLIDA. INSUBSISTÊNCIA. PERÍCIA GRAFOTÉCNICA QUE CONCLUIU PELA DIVERGÊNCIA ENTRE A ASSINATURA DA AUTORA E A CONSTANTE NO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FRAUDE COMETIDA CONTRA A AUTORA EVIDENCIADA. AUSÊNCIA DO DEVER DE CAUTELA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. RISCO DA ATIVIDADE. SÚMULA 479 DO STJ. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DA RELAÇÃO JURÍDICA QUE DEVE SER MANTIDA.[...] RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS" (TJSC, Apelação n. 5029526-29.2020.8.24.0018, do , rel. Rubens Schulz, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 31-01-2022).
Na hipótese, observa-se do conjunto probatório que o banco réu sequer acostou aos autos o contrato donde se origina o empréstimo consignado questionado.
Sem o termo pactual, impossível aferir a (in)veracidade da assinatura da autora, impondo-se a declaração de inexistência de débito entre as partes.
Cumpre ressaltar que mesmo eventual recebimento de valores pela autora não é suficiente para demonstrar a regularidade da contratação, pois não se pode descartar a ocorrência de fraude externa ou mesmo interna, o que não afasta a responsabilidade da instituição financeira, que responde por danos decorrentes do risco da atividade (Súmula 479 do STJ), sendo inviável acolher a tese de aceitação tácita de contrato bancário submetido às normas protetivas do CDC. Inocorre, aqui, aplicabilidade da teoria da supressio.
Em relação à consequente reparação dos prejuízos materiais causados à autora, estes devem ser ressarcidos, sendo que preceitua o art. 42, parágrafo único, do CDC que "O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".
Comentando o mencionado dispositivo legal, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin anota o seguinte:
"A pena do art. 42, parágrafo único, rege-se por três pressupostos objetivos e um subjetivo (= 'engano justificável').
No plano objetivo, a multa civil só é possível nos casos de cobrança de dívida; além disso, a cobrança deve ser extrajudicial; finalmente, deve ela ter por origem uma dívida de consumo.
[...] Se o engano é justificável, não cabe a repetição.
No Código Civil, só a má-fé permite a aplicação da sanção. Na legislação especial, tanto a má-fé como a culpa (imprudência, negligência e imperícia) dão ensejo à punição [...].
A prova da justificabilidade do engano, na medida em que é matéria de defesa, compete ao fornecedor. O consumidor, ao reclamar o que pagou a mais e o valor da sanção, prova apenas que o seu pagamento foi indevido e teve por base uma cobrança desacertada do credor" (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005, p. 394, 396-397).
No caso em tela, apesar de ausente demonstração de má-fé decorrente de ato perpetrado pela ré, esta é irrelevante ao deslinde da questão. De fato, não se vislumbra a ocorrência de engano justificável a amparar os descontos indevidos, sendo o que basta para ser exigível a restituição em dobro dos valores indevidamente debitados em benefício previdenciário, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC.
Nesse norte:
"AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. TELEFONIA. COBRANÇA INDEVIDA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. PROVA DE MÁ-FÉ DO CREDOR. DESNECESSIDADE. PRECEDENTE DA CORTE ESPECIAL. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA MANTIDA [...]" (STJ, AgInt nos EDcl nos EAREsp n. 656.932/RS, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Corte Especial, julgado em 8/9/2021).
Nesse sentido, entende esta Segunda Câmara de Direito Civil:
- APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO QUE A AUTORA INFORMA NÃO TER CONTRATADO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA AUTORA.PLEITEADA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSUBSISTÊNCIA. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO QUE, POR SI SÓ, NÃO GERA A PRESUNÇÃO DO DEVER DE INDENIZAR. ABALO À DIGNIDADE DA AUTORA PASSÍVEL DE INDENIZAÇÃO NÃO COMPROVADO. AFASTAMENTO DOS DANOS MORAIS MANTIDO. RECONHECIMENTO DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES. REQUERIDA REPETIÇÃO EM DOBRO. VIABILIDADE. DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA MÁ-FÉ. RÉU QUE NÃO DEMONSTROU A OCORRÊNCIA DE ENGANO JUSTIFICÁVEL. NECESSÁRIA RESTITUIÇÃO EM DOBRO DAS PARCELAS JÁ DESCONTADAS (ART. 42, PARÁGRAFO UNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.AFASTAMENTO DOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. IMPOSSIBILIDADE, DIANTE DA SUCUMBÊNCIA EM RELAÇÃO AO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SUSPENSA A EXIGIBILIDADE DO PAGAMENTO, CONTUDO, DIANTE DO DEFERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO" (TJSC, Apelação n. 5002681-46.2021.8.24.0075, do , rel. Volnei Celso Tomazini, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 05-05-2022).
- "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA AUTORA.
PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE RECURSAL SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES PELO REQUERIDO. INOCORRÊNCIA. RECURSO QUE SATISFAZ O PRECEITO DO ART. 1.010 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
MÉRITO. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. EXEGESE DA SÚMULA N. 297 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RÉU QUE, EM SUA DEFESA, SE LIMITOU A JUNTAR COMPROVANTE DE TRANSFERÊNCIA DOS VALORES PARA CONTA BANCÁRIA DE TITULARIDADE DA CONSUMIDORA. CIRCUNSTÂNCIA QUE, POR SI SÓ, NÃO SE MOSTRA APTA A EVIDENCIAR A REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO. ÔNUS QUE INCUMBIA AO REQUERIDO. ATO ILÍCITO EVIDENCIADO. SENTENÇA REFORMADA NO PONTO.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. VIABILIDADE. EXEGESE DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AUSÊNCIA DA DILIGÊNCIA NECESSÁRIA NO MOMENTO DA CONTRATAÇÃO. ERRO INJUSTIFICÁVEL. [...] RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO" (TJSC, Apelação n. 5001087-42.2021.8.24.0060, do , rel. Rosane Portella Wolff, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 17-02-2022).
Assim, indemonstrada a autorização para realização dos descontos em benefício previdenciário da autora, nego provimento ao recurso da ré, nesse tópico, mantendo-se a parte da sentença que julgou procedentes os pedidos de declaração de inexistência de débito e de restituição na forma dobrada (com modulação) dos valores indevidamente descontados.
5. Repetição de indébito
O banco prossegue argumentando que a restituição dobrada exige engano injustificável, o que não ocorreu, pois a instituição agiu de boa-fé e no regular exercício de direito. Sustenta que eventual devolução deve ser simples, e apenas se reconhecida irregularidade formal. Alternativamente, pugna pela modulação dos efeitos para o pagamento da repetição dobrada.
Sem razão.
É que a sentença determinou que todos os valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da autora fossem restituídos em dobro.
Como se sabe, a repetição dobrada nas hipóteses de empréstimo consignado indevidamente pactuado em nome do consumidor tem a modulação na forma do EAREsp 676.608/RS (incluído no Tema 292 do STJ) - isto é, restituição simples em cobranças realizadas até 30-3-2021 e, em dobro, após esta data.
Há notícia nos autos de que o primeiro dos descontos indevidamente efetivados no benefício aconteceu em maio de 2021; por esta razão, reputa-se correta a disposição da sentença que determina a devolução dobrada dos valores questionados pela apelada.
6. Compensação / devolução de valores
Requer, subsidiariamente, a compensação dos valores eventualmente devidos com o montante do crédito efetivamente liberado à autora, conforme o art. 368 do CC, uma vez comprovado o depósito.
O apelo comporta provimento neste tópico.
No tocante à compensação de créditos, inocorre julgamento extra ou ultra petita, pois o desfazimento do contrato (rescisão, anulação, declaração de nulidade) ou até mesmo o reconhecimento de sua inexistência tem, como consequência lógica, o retorno das partes ao statu quo ante, acarretando a exigibilidade da devolução de valores recebidos em razão do pacto, até mesmo para evitar o enriquecimento sem causa.
Aliás, preceitua o art. 182 do Código Civil que "anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente".
Nesse norte, mutatis mutandis:
- "[...] a condenação da autora à devolução dos valores recebidos [...] não representa julgamento extra petita, pois trata-se de uma decorrência lógica do pedido de rescisão contratual" (TJSC, Apelação Cível n. 2010.083351-0, de Criciúma, excerto do voto do rel. Marcus Tulio Sartorato, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 15-03-2011).
- "Anulado o negócio jurídico, impõe-se a devolução das parcelas pagas, pena de enriquecimento ilícito de uma das partes em detrimento da outra" (TJSC, Apelação Cível n. 1998.008249-8, da Capital, rel. Wilson Augusto do Nascimento, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 27-08-2002).
Acerca da necessidade de devolução de valores pela parte autora ou compensação de crédito em relação a esses valores, decidiu esta Segunda Câmara de Direito Civil:
- "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA QUE ALEGA TER SIDO A CONTRATAÇÃO REALIZADA DE FORMA REGULAR. IMPUGNAÇÃO DAS ASSINATURAS CONSTANTES NOS INSTRUMENTOS. REQUERIDA QUE SE MANTEVE INERTE COM RELAÇÃO A REALIZAÇÃO DE PROVA PERICIAL, NÃO SE DESINCUMBINDO, PORTANTO, DO ÔNUS QUE LHE CABIA (ART. 373, II DO CPC). RECONHECIMENTO DA RELAÇÃO JURÍDICA. SENTENÇA MANTIDA. AUTORA QUE ALEGA TER SOFRIDO ABALO MORAL. DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO QUE, ISOLADAMENTE, NÃO ENCERRAM DANO ANÍMICO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE GRAVE IMPACTO AO SEU ORÇAMENTO. INEXISTÊNCIA DE CONSEQUÊNCIAS LESIVAS À DIGNIDADE OU AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE DA RECORRENTE. ABALO ANÍMICO NÃO EVIDENCIADO. PLEITO DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. VIABILIDADE. EXEGESE DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. DESCONTOS QUE DECORREM DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO NÃO ENTABULADO PELA PARTE. AUSÊNCIA DE DILIGÊNCIA NO MOMENTO DA CONTRATAÇÃO. ERRO INJUSTIFICÁVEL. NECESSIDADE, CONTUDO, DE COMPENSAÇÃO DOS VALORES A SEREM RESTITUÍDOS COM O IMPORTE DEPOSITADO NA CONTA BANCÁRIA DA CONSUMIDORA. [...] RECURSO DE APELAÇÃO DA REQUERIDA CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DE APELAÇÃO DA AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO" (TJSC, Apelação n. 5001081-79.2019.8.24.0068, do , rel. Rosane Portella Wolff, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 03-03-2022).
- "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM REPETIÇÃO DO INDÉBITO E PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO BANCO RÉU. PRETENSA REFORMA DA SENTENÇA. ALEGADA CONTRATAÇÃO VÁLIDA. INSUBSISTÊNCIA. PERÍCIA GRAFOTÉCNICA QUE CONCLUIU PELA DIVERGÊNCIA ENTRE A ASSINATURA DA AUTORA E A CONSTANTE NO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FRAUDE COMETIDA CONTRA A AUTORA EVIDENCIADA. AUSÊNCIA DO DEVER DE CAUTELA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. RISCO DA ATIVIDADE. SÚMULA 479 DO STJ. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DA RELAÇÃO JURÍDICA QUE DEVE SER MANTIDA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. PRETENSO AFASTAMENTO. NÃO ACOLHIMENTO. AUTORA QUE COMPROVOU OS DESCONTOS EFETUADOS EM SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESNECESSIDADE E COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO QUE FOI FIRMADO MEDIANTE ATO DE TERCEIRO FALSÁRIO. ÔNUS DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ DE COMPROVAR O ENGANO JUSTIFICÁVEL. EXEGESE DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO DO CDC. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE FIXOU TESE EM EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO SENTIDO DA PRESCINDIBILIDADE DA COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE COBROU O VALOR INDEVIDO. CONDENAÇÃO EM DOBRO QUE MOSTRA-SE APLICÁVEL NOS CASOS DE CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA (EARESP 676.608/RS). RESTITUIÇÃO DOS VALORES EM DOBRO DEVIDA. SENTENÇA MANTIDA. DEVER DE COMPENSAÇÃO DE VALORES DA CONDENAÇÃO COM AQUELES DEPOSITADOS NA CONTA BANCÁRIA DA AUTORA. [...] RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO" (TJSC, Apelação n. 5000749-50.2019.8.24.0024, do , rel. Rubens Schulz, Segunda Câmara de Direito Civil, j. 08-07-2021).
No caso concreto, a instituição financeira ré demonstrou que realizou transferência para conta bancária da autora (33.3);
Assim, nesse tópico dou provimento ao recurso da ré para autorizar a compensação de créditos, devendo-se consignar serem inaplicáveis juros de mora sobre essas quantias a serem devolvidas à requerida (devendo incidir somente a partir do trânsito em julgado), porquanto a autora não deu causa ao desfazimento do contrato, cabendo apenas aplicação de correção monetária pelo INPC desde a data de depósito, e pelo IPCA a partir da Lei 14.905/24.
7. Dever de indenizar os danos morais
Alega o banco que não há prova de sofrimento, constrangimento ou abalo de crédito, tratando-se de mero dissabor, incapaz de ensejar reparação extrapatrimonial.
Convém ressaltar que não se desconhece a vertente jurisprudencial de que "os danos morais resultantes de desconto indevido efetuado diretamente no benefício previdenciário do lesado são presumidos" (TJSC, Apelação Cível n. 0302491-25.2017.8.24.0079, de Videira, rel. Fernando Carioni, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 12-05-2020).
In casu, a presunção incidente sobre o abalo moral está assentada no potencial comprometimento da verba alimentar da beneficiária, porquanto é evidente o abalo psíquico sofrido por pessoa idosa que é privada de mais de 10% de seus recursos econômicos mensais, em decorrência de contrato de empréstimo por ela não firmado.
Não houve apenas dissabor momentâneo, pois os descontos prejudicaram o sustento da autora, existindo prova robusta deste comprometimento.
Nesse contexto, "O desconto indevido em conta corrente, via de regra, configura mero dissabor, incapaz de gerar danos morais. Todavia, em tese, é possível que os contornos do caso concreto mostrem-se extraordinários, hipótese em que o aborrecimento poderá dar lugar a sentimentos de intensa frustração, angústia, constrangimento ou sofrimento intenso capaz de configurar abalo anímico" (TJSC, Apelação Cível n. 0300141-54.2016.8.24.0029, de Imarui, rel. Álvaro Luiz Pereira De Andrade, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 09-05-2019).
Portanto, existindo os danos morais pleiteados, mantém-se a sentença neste tópico.
8. Resultado do julgamento
Por essas razões, conheço do recurso e dou-lhe provimento em parte tão somente para autorizar a compensação de créditos, devendo-se consignar serem inaplicáveis juros de mora sobre essas quantias a serem devolvidas à requerida (devendo incidir somente a partir do trânsito em julgado), porquanto a autora não deu causa ao desfazimento do contrato, cabendo apenas aplicação de correção monetária pelo INPC desde a data de depósito, e pelo IPCA a partir da Lei 14.905/24.
Sem honorários recursais, porque incabíveis na hipótese.
9. Dispositivo
Em decorrência, voto no sentido de conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcial.
assinado por MONTEIRO ROCHA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6985920v8 e do código CRC 55962eed.
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Documento:6985921 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5000245-06.2025.8.24.0001/SC
RELATOR: Desembargador MONTEIRO ROCHA
EMENTA
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - OBRIGAÇÕES - RESPONSABILIDADE CIVIL - EMPRÉSTIMO CONSIGNADO - DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO - AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO - DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PARCIAL PROCEDÊNCIA EM 1º GRAU - RECURSO DA RÉ - 1. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA ANTE O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - INACOLHIMENTO - DILAÇÃO PROBATÓRIA DESNECESSÁRIA AO DESLINDE DO FEITO - ACERVO PROBATÓRIO SUFICIENTE PARA A FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO MAGISTRADO - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 371, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - 2. PRELIMINAR - ARGUIDA AUSÊNCIA DE INTERSSE DE AGIR ANTE A INEXISTÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO - PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO E DO ACESSO À JUSTIÇA - ART. 5º, INC. XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - OFENSA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DE ACESSO À JUSTIÇA - PRELIMINAR REJEITADA - 3. RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL - VÍCIO DE CONSENTIMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA E CONDENATÓRIA - NULIDADE CONTRATUAL - PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA - PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA - 4. MÉRITO - EXIGIBILIDADE DOS DESCONTOS - INACOLHIMENTO - CONTESTAÇÃO DA CONTRATAÇÃO PELA AUTORA - ART. 429, II, DO CPC - ÔNUS DE PROVA DA AUTENTICIDADE A CARGO DAQUELE QUE PRODUZIU O DOCUMENTO (RÉ) - AUTENTICIDADE INCOMPROVADA - AUTORIZAÇÃO DE DESCONTO INDEMONSTRADA - TESE DE ACEITAÇÃO TÁCITA PELO CONSUMIDOR INVIÁVEL - RELAÇÃO CONTRATUAL ENTRE AS PARTES INCOMPROVADA - REPETIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DEBITADOS - AUSÊNCIA DE ENGANO JUSTIFICÁVEL - APLICAÇÃO DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC - PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DECLARATÓRIO E DE REPETIÇÃO DOBRADA MANTIDA - 5. COMPENSAÇÃO / DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS PELA PARTE AUTORA - ACOLHIMENTO - DESFAZIMENTO DO CONTRATO QUE, COMO CONSEQUÊNCIA LÓGICA, ACARRETA O RETORNO DAS PARTES AO STATU QUO ANTE - COMPENSAÇÃO AUTORIZADA - 6. DEVER DE INDENIZAR ABALO MORAL - PLEITO DE AFSTAMENTO - TESE REJEITADA - COMPROMETIMENTO DE VERBA ALIMENTAR - COMPROVAÇÃO - OFENSA MORAL EVIDENCIADA - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E EM PARTE PROVIDO.
1. Inexiste cerceamento de defesa por julgamento antecipado da lide se os documentos carreados aos autos, à luz da causa de pedir, são suficientes para o deslinde da quaestio, mormente quando a demanda exige produção de prova pericial a cargo do réu que não foi por este requerida.
2. Não se podendo excluir do Judiciário a apreciação de lesão ou ameaça a direito, é dispensável o exaurimento da via administrativa para a indenizatória fundada em não contratação de empréstimo consignado.
3. Indemonstrada pelo réu a autorização para desconto em benefício previdenciário da autora, procedem os pleitos declaratório de inexistência de débito e de repetição de indébito.
4. A determinação de devolução ou compensação de valores recebidos não configura julgamento extra ou ultra petita, porque é mera consequência lógica do desfazimento do contrato, sendo que se procede à referida compensação do montante que o réu demonstrou ter repassado atinente ao empréstimo contratado.
5. Desconto não autorizado por servidor, a título de empréstimo consignado, com comprometimento de sua verba alimentar, enseja indenização por danos morais.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 2ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
assinado por MONTEIRO ROCHA, Desembargador, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6985921v5 e do código CRC 1bdca5a8.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 13/11/2025 A 19/11/2025
Apelação Nº 5000245-06.2025.8.24.0001/SC
RELATOR: Desembargador MONTEIRO ROCHA
PRESIDENTE: Desembargador MONTEIRO ROCHA
PROCURADOR(A): LENIR ROSLINDO PIFFER
Certifico que este processo foi incluído como item 38 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 27/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 13/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 15:39.
Certifico que a 2ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 2ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PROVIMENTO PARCIAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador MONTEIRO ROCHA
Votante: Desembargador MONTEIRO ROCHA
Votante: Desembargadora ROSANE PORTELLA WOLFF
Votante: Desembargador JOÃO MARCOS BUCH
YAN CARVALHO DE FARIA JUNIOR
Secretário
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